Técnica utiliza 49,8% dos recursos em reservatórios, o que permite o plantio durante todo o ano em áreas com escassez hídrica, como é o caso do melão no semiárido brasileiro e da cana-de-açúcar no Centro-Oeste. Sistema é utilizado em 8,2 milhões de hectares no país. Irrigação é aplicada em 8,2 milhões de hectares no Brasil.
Reprodução / G1
Praticamente metade da água disponível em reservatórios no Brasil vai para a irrigação. É ela que permite o plantio durante todo o ano em áreas com escassez hídrica, caso do melão no semiárido brasileiro e da cana-de-açúcar no Centro-Oeste, onde a seca acontece sazonalmente.
No Brasil – um dos dez países com maior área equipada para irrigação –, a prática é utilizada em 8,2 milhões de hectares. Equivalente a mais de 8 milhões de campos de futebol, essa área é preenchida por cultivo de arroz, café e cana, entre outros (os três são os mais comuns nesse sistema).
A irrigação é o destino de 49,8% das águas brasileiras disponíveis para uso que estão em reservatórios, segundo o Atlas da Irrigação, lançado na quinta-feira (25). Ele foi desenvolvido pela Agência Nacional das Águas (ANA).
De acordo com a entidade, a irrigação representa “o principal tipo de uso [de água] no país em termos de quantidade utilizada”. Na sequência, vêm abastecimento humano (24,3%), indústria (9,7%), animal (8,4%), termelétricas (4,5%), abastecimento rural (1,6%) e mineração (1,7%).
De onde vem o que eu como: conheça a série do G1
Status da irrigação no Brasil
Com a irrigação, o produtor deixa de depender do ciclo das chuvas para plantar e passa a ter um cultivo de duas a três vezes mais produtivo.
Segundo o Atlas da Irrigação, a agricultura irrigada usa 29,7 trilhões de litros de água ao ano.
Apesar da grande quantidade de água necessária para irrigação, essa técnica não representa ameaça de escassez ao usuário comum. Isso porque o irrigador só pode usar os recursos hídricos para esse fim após conseguir uma autorização, que é baseada na disponibilidade da água de cada reservatório.
Por outro lado, ocorre desperdício – e as suas principais causas seriam os sistemas antigos e a falta de manutenção e monitoramento.
A irrigação no Brasil vai crescer: até 2040, os números de hectares irrigados devem aumentar em 75% com relação ao cenário atual.
O setor, que está em plena expansão, tem o crescimento de área irrigada em 4% ao ano, de acordo com a ANA.
Só em 2020, expandiu 18,96% em relação a 2019, contabilizando um aumento de 249.225 mil hectares, apontou o levantamento da Câmara Setorial de Equipamentos de Irrigação (CSEI) e da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).
Segundo o Atlas da Irrigação, o aumento da área que faz uso da técnica é mais expressivo em São Paulo, Minas Gerais, Tocantins, Bahia, Rio Grande do Sul e Goiás.
Conheça os tipos de irrigação
O termo “irrigação” é usualmente associado àquela imagem de chuveirinhos no solo, como nos jardins retratados em filmes americanos. Mas, na realidade, existem quatro métodos diferentes de irrigação – e cada um deles, por sua vez, se estende em diferentes sistemas.
De acordo com o Atlas da Irrigação, do total de área que usa essa técnica no Brasil, 5,3 milhões de hectares são apenas de irrigação, ou seja, usam os métodos para entregar somente água.
Os outros 2,9 milhões são operados para a fertirrigação, uma técnica de adubação que aproveita a água para levar nutrientes ao solo.
Conheça os tipos de Irrigação
Arte / G1
Não existe uma única melhor maneira de irrigar. A indicação depende das especificidades da plantação, que levam em conta o solo, o clima e o próprio cultivo.
De acordo com o estudo, as características de cada um dos métodos e sistemas são importantes até mesmo para estimar as perdas que ocorrem. Esse cálculo leva em conta a quantidade captada nos corpos hídricos e aquilo que é efetivamente aproveitado pelas plantas.
Segundo o relatório da CSEI e da Abimaq, dos cerca 250 mil novos hectares irrigados no Brasil em 2020, os sistemas mais usados foram (do mais habitual para o menos):
Aspersão com pivô central – técnica que aplica a chuva artificial por meio de um mecanismo móvel, irrigando uma área circular em torno de um ponto fixo.
Gotejamento – o cultivo é hidratado por meio de gotas diretamente na área das raízes.
Aspersão convencional – a água é aplicada em forma de chuva, de maneira intensa e uniforme, tendo como objetivo a sua infiltração.
De acordo com o Atlas da Irrigação, o arroz é o produto mais comum entre as plantações irrigadas no Brasil, principalmente usando o método de irrigação superficial no sistema de inundação, caso em que a água é aplicada em abundância diretamente no solo. Em seguida, aparecem o café e a cana.
Por que irrigar?
Os benefícios da irrigação são inúmeros, a começar pelo fato de o sistema ser de duas a três vezes mais produtivo do que a agricultura de sequeiro, onde não há irrigação – e, por isso, o agricultor fica dependente do ciclo das chuvas.
“A irrigação elimina um dos principais fatores de estresse da produção, que é a falta de água”, diz o professor Fernando Campos Mendonça, do curso de Engenharia Agronômica da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP).
Segundo ele, o desenvolvimento dos sistemas de irrigação a partir da década de 1970, associado ao melhoramento genético, contribuiu para o aumento da produção de alimentos no Brasil, transformando regiões antes improdutivas, como o Cerrado, em grandes fornecedoras de grãos.
Uva o ano todo, castanha segura: veja 5 pesquisas que mudaram consumo
Os avanços permitiram diversificar e expandir o número de cultivos no ano.
“A soja, por exemplo, tinha um ciclo longo, não dava para plantar milho na sequência, como é hoje. Com melhoramento genético, esse ciclo encurtou e, com a irrigação, o agricultor não precisa esperar a chuva [para plantar]”, diz Mendonça.
A disponibilidade de água também é fundamental para o cultivo de frutas e verduras.
Ao aumentar a produtividade das lavouras, a irrigação contribui para diminuir o desmatamento, diz o engenheiro agrônomo Luis Fernando Guedes Pinto, diretor de conhecimento da ONG SOS Mata Atlântica,
“Se você pode produzir mais em menos áreas, não é necessário abrir novas áreas”, afirma.
Para ele, a irrigação ainda tem potencial de crescer no Brasil, mas é preciso fazer isso de forma planejada, para evitar perda de água.
Reportagem de maio 2020 a irrigação ajuda produtores a aprimorar cultivo do feijão durante períodos de seca.
Tem água para tudo isso?
A água que chega às plantações vem do mesmo lugar da que sai das nossas torneiras, considerando os reservatórios de cada região, segundo o superintendente de planejamento da ANA, Sérgio Ayrimoraes.
Ainda assim, ninguém precisa se preocupar em ficar sem água por causa dos sistemas irrigatórios, pois, apesar de as plantações capturarem mais da metade da água brasileira, não basta ao agricultor apenas abrir o registro.
Ele precisa, primeiramente, pedir a autorização para o uso dessa água. A permissão, que se chama outorga, é dada pelo órgão público que gere os recursos hídricos, que pode ser a ANA ou algum outro de ordem estadual, explica Ayrimoraes.
“O controle dessas outorgas [é] que me garante que não vai faltar água, que eu tenho uma quantidade de água no rio que é suficiente pra suprir todos os grupos”, afirma.
Essa autorização é dada apenas quando o órgão tem certeza de que o consumo de um usuário não vai impactar o de outro, garantindo que a disponibilidade da água é maior do que a sua demanda.
“O controle do balanço hídrico é igual ao controle do orçamento. A sua receita é a quantidade de água disponível e as suas despesas são equivalentes ao uso da água”, diz Ayrimoraes.
“Para você ter orçamento equilibrado, a sua receita tem que ser superior às suas despesas, se não começa a faltar dinheiro, ou, no caso, a água. ”
Na solicitação, o agricultor deve informar qual a quantidade de água que pretende usar. A outorga, então, passa a ser fiscalizada com objetivo de impedir que esse limite seja ultrapassado.
Se este acordo for violado, o irrigador pode sofrer sanções, multas e até mesmo ter a outorga revogada.
Além disso, segundo o superintendente de planejamento da ANA, apesar do aumento de áreas irrigadas, o uso da água não vai crescer na mesma proporção devido às especificidades de cada região e cultura.
Outro fator é o desenvolvimento tecnológico que vem permitindo a área irrigada ter uma melhor eficiência, usando menos água no mesmo território, explica.
Ocorre desperdício de água?
Sim, segundo o especialista da SOS Mata Atlântica Luis Fernando Guedes Pinto. Ele, no entanto, diz desconhecer números que mostrem exatamente o quanto se perde.
“O que se observa no Brasil é que tem muita gente que ainda molha as plantas e não faz irrigação. Somente a água que é absorvida pela raiz é aproveitada. O resto é perda: a água que está caindo no chão, nas plantas”, afirma.
“Os sistemas que jogam água na lavoura como um todo, que molham as folhas, que são os métodos de aspersão e pivô central, são os que o aproveitamento da água é menor, porque uma boa parte da água evapora, bate nas folhas e já evapora e nem cai no solo”, complementa.
Contribuem para o desperdício sistemas antigos de irrigação, falta de manutenção e monitoramento, explica Pinto.
“Muitas vezes, se irriga sem saber se vai chover ou não, se o solo está seco ou não”, diz o especialista.
“Hoje, nós já temos sistemas que gastam menos água, como o de gotejamento, que joga água diretamente no sistema radicular da planta [raiz]”.
Sistema de gotejamento permite um menor desperdício da água.
Francisco França/Jornal da Paraíba
Na avaliação do professor Fernando Campos Mendonça, do curso de Engenharia Agronômica da Esalq/USP, os agricultores têm melhorado a gestão do uso da água na irrigação já nos últimos anos.
Isso tem ocorrido tanto por preocupações ambientais, quanto por questões de custo.
“Qualquer gota a mais do que o necessário que o agricultor gasta é uma gota que deixou de ser jogada em uma outra parte da lavoura. Ou seja, desperdício de água significa perda de produtividade”, diz Mendonça.
“E irrigação custa caro. Os equipamentos são caros, e a manutenção também. Se usa demais a bomba, ela chega no limite e precisa trocar. E custa também energia elétrica para que o sistema consiga bombear a água de um lado para o outro”, exemplifica Mendonça.
Futuro da irrigação
A perspectiva da ANA para o futuro é a de que até 2040 os números de hectares irrigados tenham um aumento de 4,2 milhões, o que representa 76% a mais de área. Porém, o uso da água crescerá somente 66%.
Para Arymoraes, o superintendente de planejamento da ANA, neste momento não haverá espaço para o desperdício de água.
“A tendência para o futuro é ter o uso da água cada vez mais eficiente pela irrigação, o que se explica por vários motivos. A produtividade, a própria concorrência, da modernização do setor. Gastar muita água não é produtivo, água é recurso de energia, afirma.
Irrigação cresceu cerca de 40% no Brasil em dez anos
VÍDEOS Agro: A indústria-riqueza do Brasil
G1 > AGRO
Comentários do Facebook