Em busca de conexões mais profundas, Angela Maxwell partiu em uma caminhada que durou mais de seis anos, foi marcada por muitos percalços e transformou sua vida. Angela Maxwell buscou inspiração em outras exploradoras, incluindo Robyn Davidson e Rosie Swale-Pope
Angela Maxwell via BBC
“Por quê?” É uma pergunta simples, que as pessoas fazem com frequência a Angela Maxwell.
No entanto, até recentemente, a americana tinha dificuldade de apontar o motivo exato que a fez abrir mão de tudo para ir em busca de um grande sonho.
Mas, para Maxwell, é uma pergunta que vale a pena responder. Afinal, ela embarcou em uma jornada que poucas pessoas se atreveriam a enfrentar: em 2013, ela decidiu dar a volta ao mundo — andando e sozinha.
Uma caminhada solo dessa magnitude não era algo que Maxwell havia planejado. Na verdade, ela partiu nesta aventura nove meses depois de ter ouvido uma conversa em seu curso de arte sobre um homem que supostamente havia dado a volta ao mundo andando.
A jornada de Maxwell não nasceu de um momento de perda, derrota ou crise pessoal. Quando ela decidiu embarcar em uma caminhada de longa distância, ela estava na casa dos 30 anos, tinha um negócio de sucesso e estava em um relacionamento.
“Achava que estava feliz”, diz ela, “mas fazendo uma retrospectiva, percebi que estava à procura de algo mais… de uma conexão mais profunda com a natureza e as pessoas — vivendo com menos e me conectando com o mundo ao meu redor.”
A melhor maneira de descobrir isso, ela imaginou, era dando um passo atrás do outro.
Inspiração
Caminhar minimizaria sua pegada de carbono, além do que o ritmo lento significava que ela poderia mergulhar totalmente na natureza, conhecer pessoas e entender outras culturas de uma forma que é única para andarilhos.
Enquanto se preparava, Maxwell descobriu todo um universo de mulheres exploradoras para encoraja-la. Ela se apaixonou pela escrita e pelo estilo slow travel de Robyn Davidson, que atravessou a Austrália em um camelo.
Ela aprendeu sobre a andarilha Ffyona Campbell; e leu sobre Rosie Swale-Pope, que viajou de carona da Europa ao Nepal, deu a volta ao mundo velejando, cruzou o Chile a cavalo e, aos 59 anos, começou a dar a volta ao mundo correndo.
“Eu li seus livros na esperança de encontrar incentivo — e encontrei —, ao aprender sobre seus desafios e dificuldades, assim como seus triunfos. A história de cada mulher era muito diferente e isso me deu a confiança para tentar minha caminhada”, conta Maxwell.
Assim que tomou a decisão de ir, ela vendeu todos os seus pertences e organizou o equipamento necessário. Encheu um carrinho de mão com 50 quilos de equipamento para acampar, comida desidratada, filtro de água de padrão militar e roupas para as quatro estações do ano.
Maxwell deixou Bend, sua cidade natal no Oregon, em 2 de maio de 2014 e partiu para uma aventura tão grande que era provavelmente melhor que não soubesse exatamente o que a esperava ao longo do caminho.
‘Ambição, teimosia e paixão’
A americana teve insolação no deserto australiano e pegou dengue no Vietnã
Angela Maxwell via BBC
Quando falei com Maxwell pela primeira vez em junho de 2018, ela já estava viajando há quase quatro anos. Tinha caminhado mais de 20 mil quilômetros por 12 países em três continentes.
Curioso, perguntei a ela que tipo de pessoa é preciso ser para dar a volta ao mundo andando. Ela brincou: “Teimosa”.
Em seguida, acrescentou: “É provavelmente uma combinação de ambição, um pouco de teimosia e uma pitada de paixão — não pela caminhada como um esporte, mas como autoconhecimento e aventura”.
Maxwell contou que, embora ela rapidamente tenha encontrado sua rotina — acordar por volta do nascer do sol, tomar duas xícaras de café instantâneo acompanhadas por uma tigela de mingau de aveia no café da manhã, empacotar tudo, caminhar, armar o acampamento para passar a noite, comer macarrão instantâneo e se aconchegar no saco de dormir — nenhum dia era igual ao outro.
Inicialmente, ela traçou um plano, mas logo percebeu que os desvios faziam parte da aventura. É por isso que, apesar de seguir uma direção geral, ela sempre confiaria em sua intuição sobre onde virar à esquerda ou à direita.
Maxwell sofreria queimaduras do sol e insolação no deserto australiano e pegaria dengue no Vietnã; seria atacada e estuprada por um nômade que invadiu sua tenda na Mongólia; ouviria tiros ao acampar na Turquia; e aprenderia a dormir com um olho e um ouvido bem abertos, para não ficar à mercê da vulnerabilidade do sono profundo.
‘Estava decidida a não desistir do meu sonho’
‘Não comecei a andar porque era destemida — mas, sim, porque estava apavorada’
Angela Maxwell via BBC
Maxwell havia previsto provações de todos os tipos, embora fosse impossível saber quais seriam.
“Mesmo assim”, diz ela, “não comecei a andar porque era destemida — mas, sim, porque estava apavorada. Tinha mais medo de não seguir meu coração do que de perder tudo o que possuía e amava.”
Lidar com o trauma do abuso sexual acabou se tornado um momento decisivo, no qual Maxwell decidiu continuar caminhando. Embora ela ainda estivesse com medo, as histórias de perseverança e força de outras mulheres a ajudaram a continuar:
“Estava decidida a não deixar que aquilo me obrigasse a desistir do meu sonho e a voltar para casa. Tinha deixado todo o meu mundo para trás, não tinha nada para voltar e compreendia os riscos inerentes à minha jornada.”
Maxwell estava caminhando para descobrir o quão forte seu corpo e mente poderiam ser, mesmo diante da violência. Ao longo do caminho, o ritmo lento permitiu que ela fosse atraída — brevemente, mas profundamente — por outras culturas.
Encontros interculturais
O ritmo lento da viagem a estabelecer conexões significativas aonde quer que ela fosse
Angela Maxwell via BBC
Ela percorreu pequenos vilarejos à beira-mar ao longo do Mar Tirreno, na Itália, absorvendo a atmosfera vibrante e aceitando convites para conversar, sentar e tomar vinho.
No Vietnã, exausta depois de chegar ao topo da montanha Hai Van Pass, ela foi saudada por uma senhora idosa que a convidou para descansar em sua pequena cabana de madeira no cume durante a noite.
Uma relação de amizade nasceu na fronteira entre a Mongólia e a Rússia, levando a um reencontro anos depois na Suíça. Maxwell até se tornou madrinha da filha de uma mulher que conheceu na Itália.
Independentemente de esses encontros interculturais durarem sete minutos ou sete dias, Maxwell sempre manteve duas coisas em mente. Primeiro, ser uma boa ouvinte para aprender.
“Andar me ensinou que tudo e todos têm uma história para compartilhar, só temos que estar dispostos a ouvir”, observa.
Ao longo de sua jornada, ela aprendeu receitas tradicionais de família em um vilarejo italiano, apicultura na Geórgia e tratamento de camelos na Mongólia na histórica Rota da Seda.
Em segundo lugar, Maxwell aprendeu a importância da contribuição. Ela cortou lenha na Nova Zelândia e distribuiu comida para moradores de rua na Itália. Na Sardenha, ela ajudou um fazendeiro italiano a reformar sua casa.
‘Desistir nunca foi opção’
Maxwell sempre seguiu sua intuição sobre onde virar à esquerda ou à direita
Angela Maxwell via BBC
Na maioria das vezes, no entanto, as histórias de Maxwell foram sua maior contribuição. Ela falou em encontros informais, em escolas e universidades, e até mesmo no palco do TEDx em Edimburgo, na Escócia, compartilhando suas experiências para inspirar outras pessoas.
Ela se tornou uma voz pelo empoderamento feminino, especialmente depois que decidiu continuar caminhando apesar do ataque na Mongólia. “Desistir nunca foi uma opção”, diz ela.
Ao longo de sua peregrinação, Maxwell coletou doações para ONGs como a World Pulse e Her Future Coalition, que se dedicam a apoiar meninas e mulheres jovens. No total, ela arrecadou cerca de US$ 30 mil.
Abraçar a curiosidade e a mente aberta, sugere Maxwell, é uma maneira poderosa de “vivenciar mais profundamente o mundo e seus habitantes”.
Por seis anos e meio, Maxwell escolheu um estilo de vida de curiosidade, incerteza e extrema vulnerabilidade. E ela fez isso em busca de algo que nunca poderia ter certeza de encontrar: felicidade pessoal e uma conexão mais profunda com o mundo ao seu redor.
Em 16 de dezembro de 2020, a peregrinação de Maxwell chegou ao fim exatamente onde começou: na casa de sua melhor amiga Elyse em Bend.
Assim como ela atendeu ao chamado para começar sua jornada, ela sabia que era a hora certa para encerrá-la. Ela sabia, também, que essa aventura havia se tornado um modo de vida ao qual ela poderia retornar a qualquer momento.
Por enquanto, porém, ela está trabalhando em um livro, planejando futuras viagens e criando maneiras de as mulheres encontrarem, expressarem e incorporarem coragem em suas vidas diárias.
Quer uma caminhada leve ao outro lado do mundo ou só até o fim da rua, Maxwell mostrou o verdadeiro valor de desacelerar, prestar mais atenção e dar mais do que recebemos ao longo do caminho.
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