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De onde vem o que eu como: com gosto de sábado, feijoada ajuda a movimentar mais de R$ 40 bilhões no campo


Na cidade, a combinação de carne de porco com feijão preto é clássica: veja dicas para ficar ainda melhor. No campo, aumento do consumo dos dois alimentos é o desafio. Feijoada: o prato que ajuda a movimentar bilhões de reais
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A feijoada é um prático típico do Brasil, e são poucos aqueles não gostam ou que não provaram essa mistura de feijão preto com partes do porco – com uma pitada de carne bovina.
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Esse prato junta duas cadeias importantes do nosso agronegócio: a criação de suínos e a lavoura de feijão, que movimentaram mais de R$ 40 bilhões em 2020.
Feijoada nossa de cada sábado
Arte G1
Nos dois casos, a produção se concentra no Sul. Na carne de porco, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul lideram os números no país. Já o feijão preto vem, na maior parte, dos agricultores paranaenses, muito à frente dos gaúchos e catarinenses no top 3.
E, mesmo com números expressivos no campo, os dois setores buscam aumentar o consumo desses alimentos no país. A carne suína é apenas a terceira mais comprada, já os agricultores observam as pessoas comendo menos feijão ano após ano, além da dependência da Argentina (leia mais abaixo).
Gosto de folga
O chef Marcelo Bastos é dono de um dos restaurantes de comida brasileira mais famosos na cidade de São Paulo, o Jiquitaia. Ele conta que a inspiração partiu dos avós, que também eram cozinheiros.
“Meus avós por parte de mãe tinham um restaurante popular, e tinha muito de cozinha brasileira e queria resgatar um pouco dessa cozinha deles, comida de vó. O Jiquitaia partiu dessa cozinha tradicional e a busca por outras comidas tradicionais”, diz.
A feijoada foi um dos primeiros pratos do menu do restaurante
Jiquitaia/Divulgação
Bastos conta que, ao montar o estabelecimento, em 2012, a feijoada foi uma das primeiras escolhas para o cardápio. Não por acaso, é hoje um dos pratos mais vendidos do restaurante, mesmo sendo servido apenas aos sábados.
O chef explica que uma boa feijoada deve ter os miúdos. O motivo é que o colágeno desses cortes ajuda na textura do caldo, para que ele não fique muito aguado.
“O que eu mais gosto na feijoada é essa variedade de cortes e texturas, é um prato ‘sinfônico’. Uma feijoada para ser boa tem que ter orelha, pé… cozidas no ponto certo, para cada mordida ter um som.”
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Por muitos anos, existia a versão de que o prato teve origem entre os escravizados, que receberiam os miúdos do porco para comer.
Porém, com o passar dos anos, se viu que versão não tinha sentido, visto que a escassez de carne era grande naquele período, e os fazendeiros aproveitavam todo o animal.
“A feijoada é um prato de origem Ibérica, ali na Espanha e Portugal. Puchero, cozido, cassoulet, feijoada… são todas variações do mesmo tema. É um prato simples, camponês”, explica Marcelo Bastos.
Chef Marcelo Bastos, proprietário do Jiquitaia
Jiquitaia/Divulgação
No preparo de seu restaurante, a defumação dos cortes e os embutidos são feitos na casa. Quando não, são comprados de produtores artesanais. Mas, para quem quer fazer algo para família e amigos, o chef dá as dicas.
A sugestão de preparo é a seguinte:
Linguiça (não precisa ser paio);
Carne seca bovina;
Costela suína defumada;
Lombo;
Rabo;
Orelha;
Língua;
Pé.
“Mesmo que não queira comer, precisa colocar. Depois, tira”, reforça o chef.
Para refogar:
Cebola;
Alho;
Pimenta de cheiro;
Coentro;
Cominho;
Toucinho;
Cachaça envelhecida (opcional).
Com o caldo já em preparo, é indicado utilizar algumas raspas de laranja para trazer acidez e “quebrar” um pouco a gordura.
Se você deixar o feijão de molho de um dia para o outro, é possível fazer sem panela de pressão, cozinhando por 3 horas. Senão, você pode preparar na pressão por 40 minutos após a panela “apitar”.
Para o arroz, nenhum segredo, a receita de sempre. No molho de pimenta, a dica é utilizar a malagueta e, na farofa, azeite de dendê em vez do tradicional. A couve só precisa de um refogado simples com alho.
E está pronta! O dia para comer pode ser qualquer um, mas o fim de semana sempre acaba sendo uma boa opção.
“A feijoada tem cara de sábado, as pessoas sentem o gosto da folga”, completa Bastos.
Além da famosa feijoada, o restaurante também trabalha outros cortes do porco, como a barriga para o preparo do torremos e a bochecha, um prato que não é muito comum no país, mas que é bastante consumido na Europa.
Torresmo é uma das entradas mais vendidas do restaurante
Jiquitaia/Divulgação
“Eu tenho apreço muito grande pelo aproveitamento total, e o porco é o que se consegue trabalhar melhor. Temos acesso mais fácil no mercado a cortes menos nobres, o que é mais difícil com a carne bovina e ovina, por exemplo.”
A vez do porco
A produção de carne de porco está em pleno crescimento no país, com incremento na produção de cerca de 4%, segundo a Associação Brasileira dos Criadores de Suínos (ABCS).
O bom momento coincide com a dificuldade da China, maior consumidora e produtora desta carne. Os chineses enfrentam, desde o final de 2018, uma severa crise de peste suína africana, que dizimou milhares de rebanhos pelo país.
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A estimativa é que os chineses tenham um déficit de carne em torno de 20 milhões de toneladas e precisaram ir às compras, enxergando o Brasil como um fornecedor confiável. As vendas para a China cresceram 40% entre janeiro e novembro do ano passado.
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Apesar do crescimento, os criadores brasileiros não conseguem dar conta de toda a demanda. Atualmente o país produz pouco mais de 4 milhões de toneladas de carne suína, sendo que 80% fica no mercado interno.
E é justamente neste ponto que o setor busca engrenar. Atualmente, a carne de porco é a terceira mais consumida no país (17,5 kg por pessoa ao ano), muito atrás das proteínas de frango (45 kg) e bovina (27 kg).
“Ao logo dos últimos 5 anos, vimos um aumento de consumo per capta de 8 kg, é muito interessante. O frango está no seu limite e o bovino caindo em função dos preços. Nosso preço está mais convidativo”, explica o presidente da ABCS, Marcelo Lopes.
“A carne mais consumida no mundo é a suína. A Europa consome muito, a Ásia… existe no mundo já essa tendência. A Europa consome mais de 30 kg por ano, e o Brasil tem uma perspectiva gigantes para aumentar esse consumo”, acrescenta.
A aposta nesse crescimento vem de uma mudança de estratégia que começou há muitos anos. Os criadores trabalharam para mudar a imagem da carne de porco, que era associada a gordura vista como nada saudável.
“Até os anos 1970, os animais tinham sua característica voltada para a produção de banha, que era muito usada no preparo das comidas e para conservação das carnes. Quando entrou o óleo vegetal, você deixou de usar essa banha”, diz Lopes.
“Nessa época, os produtores começaram um trabalho de mudança de tecnologia. Hoje, conseguimos um rebanho todo voltado a uma carne extremamente magra e com alimentação saudável, além de ter um custo muito interessante frente à carne bovina.”
O passo seguinte foi acostumar os consumidores a carne de porco além da feijoada. Nos últimos anos a indústria começou a diminuir o peso dos cortes do animal para consumo do dia-a-dia.
Com nomes que lembravam a carne bovina, como a picanha suína, o filé mignon suíno, as pessoas começaram a associar e a comprar mais.
“A gente porcionou o suíno. Antes, você tinha um pernil de 5 kg e a costela de 4 kg. Nós adaptamos à realidade brasileiras e trouxemos muitos cortes parecidos com os bovinos, houve um marketing em cima disso”, afirma o presidente da ABCS.
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O objetivo é tentar alcançar uma expansão que a carne de frango alcançou nos anos 1990, quando o preço mais baixo e a qualidade do produto conquistou o consumidor brasileiro.
“Quando a gente aumenta um 1 kg per capita, são 90 mil novas matrizes, é um crescimento bem substancial (de produção)”, diz Lopes.
Atualmente, são mais de 40 milhões de porcos no país, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O setor conta com 20 mil produtores empresariais e, se levar em conta os de subsistência e menos tecnificados, o número passa de 1 milhão. A atividade gera cerca de 1 milhão de empregos diretos e indiretos.
Menos feijão no prato
O consumo também é o desafio dos produtores de feijão. Só que a situação é outra: os brasileiros estão comendo menos esse alimento tão comum no dia-a-dia.
Anos atrás o consumo era de 17 kg por pessoa ao ano e, atualmente, este índice está em 14 kg.
“Vivemos uma situação estranha, muitos comentam que o consumo caiu, mas será que caiu ou é porque temos uma disponibilidade menor e preços mais altos?”, questiona Marcelo Lüders, presidente do Instituto Brasileiro do Feijão (Ibrafe).
Isso porque a área plantada no país caiu cerca de 40% entre 2015 e a previsão para 2021. Diante de um mercado incerto de preços, os agricultores optam por grãos mais rentáveis e com previsão de valores, como a soja e o milho, itens que o Brasil exporta muito.
Outra dificuldade é que não existe apenas uma variedade produzida no país, e o consumo do brasileiro é bem peculiar. Embora famoso na feijoada, o feijão preto é apenas o segundo mais consumido no país, muito atrás do tipo carioca.
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O feijão carioca é um hábito quase que 100% brasileiro, nenhum outro país produz essa variedade em escala comercial para que possamos importar. Ou seja, em caso de quebra de safra ou diminuição da produção, não temos mercados para recorrer.
No caso do feijão preto, há uma dependência do alimento produzido na Argentina. Porém, o setor enfrenta crise no país vizinho e a importação foi mais difícil em 2020.
Por isso, Lüders defende que o setor comece a apresentar alternativas para o consumo de outros feijões: o vermelho e o fradinho, por exemplo… tipos que o mundo tem disponível e que será possível comprar em caso de escassez.
“Precisamos levar conhecimento da população para detalhes que eles desconhecem do feijão. Tem muito mais que o feijão carioca e o preto, dá para variar as receitas”, diz.
Outro caminho é conseguir profissionalizar o mercado por dois caminhos: negociações mais previsíveis, com as indústrias antecipando negócios, e as exportações.
“O consumo de feijão está caindo no Brasil, mas os Estados Unidos estão aumentando o consumo, a Europa também. Na pandemia, o consumidor viu que o feijão é barato, saudável, alimenta e é fácil de se preparar”, explica.
A China, principal parceira comercial do agronegócio, decidiu importar feijão em vez de produzir, e é um outro grande mercado que o Brasil negocia para abrir e que pode dar mais previsibilidade para os agricultores.
“Um dos motivos que levam o agricultor a produzir menos é a falta de previsibilidade da tendência de preços. Até 5 anos atrás, não tínhamos referências críveis, era um mercado sujeito a manipulação”, afirma Lüders.
O setor ainda foca em dar mais rastreabilidade ao feijão e também busca que o alimento seja item obrigatório na merenda escolar.
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Fonte:

G1 > AGRO

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