Segundo britânica Global Witness, JBS, Marfrig e Minerva adquiriram animais para abate de 379 fazendas que teriam desmatado cerca de 17 mil hectares irregularmente. Empresas negam irregularidades. Gado pasta em meio à fumaça causada por um foco de queimada da Amazônia em Rio Pardo, Rondônia, em setembro de 2019.
Ricardo Moraes/Reuters
A ONG britânica Global Witness divulgou um estudo em que afirma que três grandes frigoríficos brasileiros (JBS, Marfrig e Minerva Foods) continuaram comprando gado diretamente de propriedades com desmatamento ilegal no Pará nos últimos 3 anos.
Segundo o levantamento, essas empresas compraram, entre 2017 e 2019, animais de 379 fazendas com cerca de 17 mil hectares (equivalente a 20 mil campos de futebol) de desmatamento ilegal, infringindo o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre Ministério Público Federal (MPF) e os frigoríficos.
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O estudo da Global Witness, divulgado nessa quarta-feira (2), mostra que das 379 fazendas com desmatamento ilegal:
JBS comprou de 327 delas;
Marfrig, de 89;
Minerva Foods, de 16.
O G1 procurou as 3 empresas citadas para comentar o estudo.
A Marfrig disse, em nota, que desativou sua única unidade no Pará em março deste ano e que não compra mais gado de propriedades do estado. E afirmou que, nos 89 casos indicados pela ONG, “não houve nenhum abate irregular por parte da companhia”.
A Minerva disse, também em nota, que, após saber do estudo, realizou um “levantamento detalhado” e que não encontrou “qualquer irregularidade alegada pela ONG”.
Ainda segundo a empresa, das 16 propriedades, 3 não estão no banco de fornecedores e que as outras 13 “atendem integralmente aos critérios de sustentabilidade” (leia as respostas completas no final do texto).
A JBS não respondeu ao G1 até a última atualização deste texto. À ONG, a empresa também negou irregularidades.
A investigação
A Global Witness afirma que obteve todas as guias de trânsito animal (GTA) de 2014 a 2019 no site da Agência de Defesa Agropecuária do Pará (Adepará) para identificar os fornecedores de gado de JBS, Marfrig e Minerva nesse período.
A GTA é exigida pelo governo federal para controle sanitário, pois o gado é transportado por todo o país. As guias mostram o movimento do gado desde o nascimento até o abate.
Com isso, a ONG diz que usou esses documentos para determinar as fazendas de origem de todo o gado comprado pelos frigoríficos e cruzou a área com bancos de dados governamentais, como os do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
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O grupo britânico contou com apoio do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) para verificar se o desmatamento nas fazendas era legal ou ilegal – isso porque, de acordo com o Código Florestal, cada propriedade localizada no bioma Amazônia pode desmatar até 20% de sua área, se tiver autorização para isso.
Os pesquisadores analisaram se o desmatamento das propriedades ocorreu após as datas-limite impostas pelo Termo de Ajustamento de Conduta entre as empresas e o MPF.
Se foi após a data-limite, foi checado se as fazendas pediram autorização para realizar desmatamento ao governo estadual.
“Nossa investigação demonstra claramente que um setor privado não regulamentado e com políticas voluntárias de não desmatamento não conseguiu lidar com a destruição da floresta”, disse em nota Chris Moye, Investigador Sênior da Amazônia na Global Witness.
Além de acusar as empresas, a Global Witness afirma que houve falha nos processos de auditorias contratados pelos frigoríficos, como os das empresas norueguesa DNV-GL e da americana Grant Thornton.
“Todos os envolvidos – fazendas que criam gado, gigantes da indústria da carne brasileira, auditores internacionais, financiadores tradicionais, supermercados, importadores e redes de fast-food – estão destruindo florestas tropicais, ou são cúmplices, com auditorias falhas realizadas por auditores americanos e europeus”, acrescenta.
Além disso, a ONG acusa JBS e Marfrig de comprarem gado de pecuaristas acusados pelo MPF de grilagem de terras, abusos de direitos humanos de povos indígenas e ativistas dos direitos à terra, além do assassinato de representantes de movimentos de trabalhadores sem terra.
Problema maior nos fornecedores indiretos
Além do problema com fornecedores diretos, o estudo afirma que outros 116 mil hectares (140 mil campos de futebol) de desmatamento ilegal foram feitos por fornecedores indiretos – fazendas que criam o gado e vendem para que outras propriedades engordem o animal e o venda aos frigoríficos.
O problema com fornecedores indiretos já fez o MPF afirmar ao G1 que não é possível garantir que a carne produzida na Amazônia é livre do desmatamento.
Para enfrentar o problema, JBS e Marfrig anunciaram neste ano iniciativas para controlar os fornecedores indiretos. As duas empresas prometem que, até 2025, vai mapear toda sua cadeia de fornecedores na Amazônia.
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Para isso, as empresas vão exigir que os pecuaristas entreguem suas GTAs para que os frigoríficos possam analisar a origem do gado. A ideia é que isso crie um “cadastro positivo” de criadores.
Respostas das empresas à ONG
Em resposta à Global Witness, JBS, Minerva e Marfrig alegaram que as GTA’s não são documentos disponíveis ao público. Com isso, disseram que não conseguem monitorar o movimento do gado ao longo da cadeia produtiva.
Em relação às 327 de propriedades ligadas ao desmatamento ilegal, a JBS disse que que em 94% dos casos estavam cumprindo suas promessas legais e voluntárias de não desmatamento, e em 6% dos casos não tinha registros de compra de gado das fazendas em questão.
Já a Marfrig afirmou que 84 das 89 fazendas cumpriram suas promessas voluntárias e legais de não desmatamento e que não foi possível identificar compras de gado de cinco delas, de acordo com as informações enviadas
Por fim, a Minerva Foods alegou que 13 das fazendas cumpriam suas promessas voluntárias e legais de não desmatamento e que não tinha registros de compras de três delas.
Em todos os casos, a ONG considerou as justificativas como “inválidas” e manteve a posição apresentada no estudo.
Já as empresas de auditoria apontadas no relatório (DNV-GL e Grant Thornton) alegaram que restrições às auditorias podem tê-las impedido de identificar os casos encontrados pela Global Witness.
Desmatamento na Amazônia cresce 9,5%
A área desmatada na Amazônia foi de 11.088 km² entre agosto de 2019 e julho de 2020, de acordo com números oficiais do governo federal divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
De acordo com o Inpe, trata-se de um aumento de 9,5% em relação ao período anterior (agosto de 2018 a julho de 2019), que registrou 10.129 km² de área desmatada.
É a maior área desde 2008, quando o Prodes apontou 12.911 km² desmatados. O Pará concentra quase metade do desmatamento na atual temporada.
Desmatamento na Amazônia entre 2019/2020 por estados.
Fernanda Garrafiel/Arte G1
Outro lado
O G1 procurou diretamente os frigoríficos e as respostas foram:
Resposta da Marfrig
É importante esclarecer que Marfrig desativou sua única unidade no Pará, localizada na cidade de Tucumã, em março deste ano. Portanto, desde então, a companhia não compra gado de propriedades localizadas no estado.
Sobre o relatório da Global Witness, a Marfrig esclarece que:
Nos 89 casos indicados pela ONG, não houve nenhum abate irregular por parte da companhia. Todos estavam de acordo com os critérios sociais e ambientais adotados pela Marfrig.
Em cinco dos 89 casos apontados, não foi possível identificar o produtor, uma vez que o número CAR (Cadastro Ambiental Rural) informado no relatório da Global Witness não correspondia a nenhuma fazenda presente no banco de dados da Marfrig.
Os demais 84 casos foram rigorosamente avaliados e não foi identificado qualquer abate irregular, o que significa que eles estavam em conformidade com os critérios sociais e ambientais adotados pela Marfrig nas datas desses abates.
Nosso sistema de geomonitoramento utiliza análises prévias a cada negociação de animais para abate, de modo que as informações relativas aos produtores e propriedades devem ser atualizadas e aderentes aos compromissos assumidos pela empresa.
Anualmente, a Marfrig publica um relatório de auditoria de terceira parte sobre o Compromisso Público na Amazônia, assumido pela empresa em 2009, em vigência desde 5 de outubro de 2009. Implantamos diretrizes estratégicas e operacionais,concretizadas em planos de ação, para fortalecer o controle da origem do gado e mitigar quaisquer riscos de fornecimento de gado de zonas críticas. Uma das ferramentas utilizada é a Plataforma de Monitoramento Geoespacial para as fazendas fornecedoras de animais para abate na Marfrig. A área monitorada equivale a 30 milhões de hectares, um território maior
Resposta da Minerva Foods
Em relação ao estudo da ONG Global Witness relativo às compra de gado bovino pela Minerva Foods no Pará, entre 2017 e 2019, realizamos um levantamento detalhado, pixel a pixel, de cada uma das 16 fazendas citadas e não encontramos qualquer não conformidade alegada pela ONG. Nossa análise mostra que, em relação às 16 fazendas que o estudo relaciona à Minerva Foods, três delas nem sequer estão cadastradas no banco de dados da Companhia e as outras 13 atendem integralmente aos critérios de sustentabilidade. Para obter informações adicionais e detalhadas, anexamos a avaliação completa da Minerva Foods sobre o relatório da Global Witness. Inclusive, a Minerva Foods não está vinculada a 379 fazendas, como também citado no estudo.
A Minerva Foods apresenta os melhores resultados entre seus pares na auditoria do Ministério Público com o estado da arte em ferramentas de monitoramento geográfico. A empresa também não recebeu nenhum feedback da Global Witness sobre a análise entregue à ONG. Estamos confiantes nos resultados de nossa ferramenta de monitoramento geográfico – confirmados pelos resultados de auditoria do Ministério Público.
Além disso, a Minerva Foods é pioneira em ações concretas para o monitoramento dos fornecedores indiretos por meio de testes da ferramenta de monitoramento VISIPEC. Os resultados preliminares mostram 99,9% de conformidade em relação a fornecedores indiretos para três unidades na região amazônica. A Companhia também é pioneira no monitoramento geográfico de sua cadeia de suprimentos no Cerrado brasileiro e no Chaco Paraguaio, mais uma ação relevante.
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